Renato Allan Rocha Bittencourt
Graduando do Curso de Direito
Aluno-pesquisador do GPCom
Desde seu surgimento, o compliance tange num ritmo alucinante, ousado e teoricamente – secundum legem – dos bancos.
Tendo em vista, problemas surgiram e o compliance começa a ser usado como parte da instituição enquanto meio de prevenir tais ilegalidades. Diversos instrumentos são usados a partir da implementação do compliance: responsabilidade social é uma delas. De acordo com Morais (2005), compliance trata-se do dever de cumprir, de estar em conformidade e fazer executar regulamentos internos e externos, exigidos às operações da organização. Portanto, a expressão compliance é usada para nomear práticas de mitigação e prevenção de fraudes e corrupção, nas organizações de qualquer ramo de atividade. Sendo assim, os bancos adotam como base principal ao seu corpo de funcionários sistemas e regulamentos internos a serem seguidos à risca. Padronizados e escolhidos da forma mais atraente possível para os clientes do banco, juntamente com seus funcionários. Dentro da legalidade, aliás. O compliance, como meio educacional, também prevê em sua cultura, o ensino de regulamentos externos (leis, decretos, medidas provisórias) para a atuação espelhada no mais alto padrão de regularidade.
Sobretudo, todos os pontos até aqui, embora sejam de extrema relevância, não abordam o cotidiano vivido pelos membros. Tampouco, o modelo compliance evidencia a grande diferença de aplicabilidade entre outras instituições e a instituição bancária.
De acordo com JL Silva; VL Navarro (2012), os bancários passaram por momentos de redefinição em seus “traços constitutivos”, transformaram-se em “bancários-vendedores”, capacitados para atender integralmente os seus clientes, muitas vezes de forma individualizada, para cumprir metas impostas de vendas de títulos, seguros, aplicações e demais produtos e serviços bancários. É notório, portanto, toda a transformação do setor bancário entre relação funcionário-cliente e o próprio modus operandi que a mesa de negócios bancário vem atribuindo nessa nova internacionalização financeira. Os banqueiros de hoje, não são mais como os banqueiros de antigamente. Eram objetivos em suas funções, mexiam com somar, fechar e bater números. Porém hoje, mexem realmente com vendas.
Em suma, existe toda uma contextualização para definirmos que por vezes a implementação do compliance no sistema bancário não tenha suprido as expectativas de seus integrantes – o efeito compliance não tem sido visto como mudança e aumento da transparência, justamente pelas causas que o modo bancário opera hoje.
O primeiro ponto surge da mudança social ocorrida no final do século XX e início do século XXI com globalização, a era digital e da informação. Esses três atributos concluem um mercado no modo de trabalho in loco. Os bancos não ficaram de fora, com uma nova forma de pensar e agir com seus clientes, transformaram-se num modelo de negócio totalmente lucrativo. Com produtos, ações, chamativos para clientes com grande promessa de lucro em determinado negócio. No estudo proferido por JL Silva; VL Navarro (2012), desde a implementação dos princípios tayloristas, o trabalho bancário vive intenso processo de “desencantamento do antigo métier”. No caso do Brasil, essa transformação também se evidencia. Aronovich (2018), traz ideais próximas à reestruturação bancária, um acervo de pontos demonstrado: afirma, que os bancos lidam com problemas e diferenciais de informação. Onde de um lado, eles dispõem de vantagem informacional em relação a projetos e empresas que financiam; de outro, devem dominar a tecnologia de identificação dos potenciais riscos inerentes à atividade. Um adendo importante, Rosengren (1999) faz notar que, num mercado transparente como os do Estados Unidos, o maior nível de transparência por si só não preveniu eventos de falência bancária.
Afinal, a quem culpar a crise financeira dos Estados Unidos de 2007/2008? Uma pergunta difícil de responder. Não existe um culpado diretamente, todo um sistema falhou, foi um erro dos bancos em comercializar e usar o bem de seus clientes como produto a um mercado financeiro gigante. Seja de consultores, políticos e até do sistema de ensino econômico de uma das maiores universidades no planeta (Harvard), (Ferguso, 2010) sim, até seus maiores professores foram contestados e acusados por conflitos de interesses com os bancos e outras instituições financeiras. A descoberta de um único funcionário da SEC, responsável por toda gestão e fiscalização de exposição ao risco do mercado financeiro norte-americano. Mostra também as medidas desastrosas do Sistema de Reserva Federal norteamericano – FED, sustentadas e potencializadas por uma governança perigosa para a sustentabilidade econômica. Na terra da maior economia global, bancos poderosos, instituições reguladoras, banco central, é incorreto afirmar que não se tinha fiscalização, que não se tinha o sistema compliance aplicado aos bancos. Contudo aparenta uma grande ineficácia dessa tentativa de prevenção.
Há uma complicação hereditária no que se diz respeito à efetivação do compliance nos bancos. Conforme já explicado, com o início de uma transformação global no trabalho direto bancário, a pressão aumentou absurdamente, a intimidade com o cliente, a forma conduzir amizade e ser simpático a fim de ganhar um sim de uma futura proposta. O modelo se torna perigoso, árduo e no final do dia, gratificante. Foram cumpridas metas e ao mesmo tempo, descumprido normas internas e leis externas. De maneira idêntica, seus superiores trabalham com a mesma velocidade e irresponsabilidade. Um cliente requerendo algo, uma saída financeira para seu novo negócio. Como negar? Iremos perder o cliente ou conseguir uma forma de controlar a dificuldade? Um ciclo virtuoso onde o sistema interno não vê entraves para continuar operando. Em vista disso, estudos descobriram que esse quebra-cabeça se transforma no final de tudo. Cabe a instituição impetrar um sistema de transparência e integridade em todos os setores da mesma. No entanto, no decorrer do texto vimos que tal estratégia não fez com que a maioria dos bancos a partir de 2008 fossem alvos de total desconfiança de seus clientes e futuros admiradores de seus produtos e serviços. Ora, mesmo depois de todos esses acontecimentos, a reputação desses mesmos grandes líderes de mercado quase não foi afetada diretamente pelo homem médio. Talvez a confiança tenha sido reduzida, porém, quem hoje não precisa de um banco? Todos nós necessitamos do mínimo, a confiança em deixarmos nosso dinheiro parado em uma conta bancária. Num banco, é de total conhecimento que o modelo de compliance tem de ser tratado de forma completamente diferente dos aplicados em outros tipos de instituição. Não se trata mais na auditoria fiscal; visualização de contratos; investigação interna entre todos os funcionários etc… Numa agência bancária, com toda essa reestruturação ao longo dos anos, o cuidado com a transparência não cabe mais totalmente ao bem fungível e sim as pessoas que compõem o corpo financeiro da instituição.
Souza Silva e Félix (2018) consiste na reflexão que a existência de relacionamentos próximos, ou mesmo íntimos, entre funcionários e clientes, cuja motivação excede as razões de cunho comercial, constitui uma ligação não profissional (e extraprofissional) arriscada. Ainda, os autores nos levam a uma conclusão racional onde, o interesse do patrão será minimizar o risco, ao passo que o interesse dos funcionários estará em preservar os laços particulares que estabeleceram. Está caracterizado aí o conflito de interesses que, uma vez instaurado, pode impactar a implementação dos controles internos bem como o cumprimento das normas da organização.
De acordo com Wagner Giovanini (2014), configura-se conflito de interesse quando, por conta de um interesse próprio, um funcionário pode ser influenciado a agir contra os princípios da empresa, tomando uma decisão inapropriada ou deixando de cumprir alguma de suas responsabilidades profissionais. Um perigo quando se trata de responsabilização interna. Agência bancária com um modelo de negócio onde segue-se à risca toda fundamentação do compliance, pode sofrer dessa brecha significativa em seu corpo? Tal pergunta pode ser respondida pelos próprios funcionários que vivem diretamente com esses clientes. Talvez, precise mudar primeiro, a forma do trabalho em uma agência. Sistema resumido em pressão, em conseguir fechar negócio com o cliente para remuneração e cargo mais altos dentro da empresa muitas vezes extrapola diretrizes internas e leis externas. E no final todos sofremos com isso. Afinal, a sociedade é quem confia em toda a mesa onde se oferta seus produtos e serviços. Sobretudo, neste resumo da pesquisa, se trás um problema estrutural em que diante de sua complexidade, envolve questões inclusive de saúde entre os funcionários. E eventualmente nos deparamos com estudos que desenvolvem segmentos e termos para serem aplicados nos bancos. Portanto, diante de algumas descrições neste resumo, podemos perceber que a causa de uma brecha na aplicabilidade do compliance como cultura nos bancos seja notório por causa do conflito de interesses existente.
Não podemos afirmar, ainda, por esse texto que é um resumo com conclusões ainda preliminares onde todo o problema de corrupção, desvios internos, produtos e serviços perigosos que possam ser ofertados de maneira irresponsável para a sociedade é totalmente culpada somente pelo conflito de interesses. Talvez seja sim esse modo de agir, parcialmente culpada por todos esses problemas.
Souza, Silva e Félix (2018) em um de seus estudos e demonstrações gráficas, na pesquisa feita pelos autores a funcionários de certa instituição bancária, demosntra a imensa percepção de proximidade entre funcionários e seus clientes. Podendo haver uma ideia que esse tipo de proximidade afeta e deturpa o controle interno pensado para a agência.
Todas esses estudos, nos demonstram a facilidade em que os funcionários se submetem a certas ocasiões por fatos futuros simples, eventos que poderiam ser impedidos com uma cultura mais aprofundada do Compliance. De súbito, percebemos o quão modelos de Compliance e governança corporativa extremamente qualificados não obtiveram o esperado acerto nessas instituições financeiras. É preciso modificar e apresentar situações diversas das tradicionais encontradas hoje.
REFERÊNCIAS
ARONOVICH, SELMO. A Reestruturação Bancária Internacional: Experiência Recente e Possíveis Desdobramentos. In: Revista do BNDES. Rio de Janeiro: BNDES, 2018, p. 226. Disponível em: <https://web.bndes.gov.br/bib/jspui/handle/1408/882> Acesso em: 8 mai. 2021.
GIOVANINI, Wagner . Compliance – A excelência na prática. Compliance Total. São Paulo: Wagner Giovanini, 2014. Disponível em: <https://www.compliancetotal.com.br/livro> Acesso em: 10 mai. 2021.
INSIDE Job . Direção de Charles H. Ferguson. Produção de Jeffrey Lurie Christina Weiss Lurie. EUA: Sony Pictures Classics, 2010. Documentário (108 minutos). Disponível em: <https://www.netflix.com/title/80995819> Acesso em: 4 jan. 2021.
MORAIS, ESLEI JOSÉ. Controles Internos e Estrutura de Decisão Organizacional. Dissertação de Mestrado em Administração pela Universidade Federal do Paraná. Curitiba: Universidade Federal do Paraná, 2005, p. 149. Disponível em: <https://www.acervodigital.ufpr.br/handle/1884/34217> Acesso em: 8 mai. 2021.
SILVA, JL; NAVARRO, VL. Organização do trabalho e saúde de trabalhadores bancários. In: Revista Latino-Americana de Enfermagem. V. 20. Ribeirão Preto: Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, 2021, p. 226-34. Disponível em: <http://rlae.eerp.usp.br/> Acesso em: 9 mai. 2021
SOUZA, Gustavo ; SILVA, Elizângela ; FÉLIX JÚNIOR, Luiz. Controle Interno E Conflitos de Interesses em Instituições Financeiras. In: Revista de Gestão e Contabilidade da UFPI. Vol.5. Floriano: Universidade Federal do Piauí, 2018. Disponível em: <https://www.ojs.ufpi.br/index.php/gecont/article/view/4412> Acesso em: 5 mai. 2021.