Bruno Teixeira Peixoto
Advogado
Especialista em Direito Ambiental e Urbanístico
Mestrando em Direito Internacional e Sustentabilidade

Há um amplo movimento mundial pela introdução e aprimoramento da conformidade ambiental na economia, na política e na gestão das organizações, públicas ou privadas, especialmente pós-pandemia, cuja retomada exigirá novos padrões de desenvolvimento para a sociedade, como almeja o Green New Deal ou Novo Acordo Verde, recentemente lançado pela União Europeia, dentre outros países.

Essa reorientação ambiental do status quo alcançou o mercado financeiro, haja vista os posicionamentos dos maiores fundos de investimentos mundiais pela observação de padrões sustentáveis nos modelos de negócios e serviços (sobretudo em face de empresas e do governo brasileiros), confirmando uma tendência que cada vez mais exigirá das empresas um compliance ambiental efetivo.

Além da pressão social, o setor empresarial tem um conjunto de razões jurídicas para levar a sério o imperativo de ser e de parecer mais sustentável (ARAGÃO et tal, 2020, p. 25). Muito além de uma “simples sustentabilidade” para os negócios, um programa de compliance ambiental deve reunir elementos de monitoramento e controle contínuos em face de potenciais e concretas lesões ao meio ambiente.

De tal modo, sua estrutura deve procurar obedecer à dos programas de integridade aplicados à política anticorrupção, desenhados no Brasil pela Lei Federal n.º 12.846/2013 e seu Decreto n.º 8.420/2015, isto é, deve consistir em um conjunto de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e na aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta, políticas e diretrizes com objetivo de detectar e sanar desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos, especificamente, em face do meio ambiente.

Com essa intenção, há em tramitação no Parlamento brasileiro o Projeto de Lei Federal n.º 5.442/2019, visando regulamentar os programas de conformidade ambiental ou compliance ambiental, de modo a exigi-lo das pessoas jurídicas que explorem atividade econômica potencialmente lesiva ao meio ambiente, inclusive, propondo que a União, Estados, Distrito Federal e Municípios não contratem pessoas jurídicas que não possuam programa de conformidade ambiental, quanto a obras e serviços, concessão e permissão de serviços públicos e até parcerias público-privadas.

A iniciativa de lei ainda prevê a vedação do fomento estatal às pessoas jurídicas que não detenham programa de conformidade ambiental, afetando a concessão de subvenções econômicas, financiamentos públicos, incentivos fiscais e doações públicas, consagrando a fundamental importância econômica e jurídica de um programa de compliance ambiental.

Em conjunto com o referido projeto, é preciso ressaltar a Resolução n.º 4.327 de 2014, do Banco Central do Brasil, pela qual as instituições financeiras, públicas ou privadas, devem observar, nas concessões de crédito e financiamentos, se o(a) interessado(a) dispõe de uma política de responsabilidade socioambiental acerca dos eventuais riscos ao meio ambiente, cuja implementação depende diretamente de um efetivo programa de compliance ambiental.

Todo esse contexto é de extrema pertinência quando contrastado com o ordenamento jurídico ambiental brasileiro, na medida em que a responsabilidade administrativa, civil e criminal por ilícitos ambientais possui denso framework regulatório, sobretudo para pessoas jurídicas.

Basta citar o art. 2º da Lei Federal n.º 9.605/98 (Lei de Crimes e Infrações Administrativas Ambientais), o qual preconiza que, “quem, de qualquer forma, concorre para a prática dos crimes previstos nesta Lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida da sua culpabilidade, bem como o diretor, o administrador, o membro de conselho e de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto ou mandatário de pessoa jurídica, que, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixar de impedir a sua prática, quando podia agir para evitá-la”.

A mesma lei federal ainda em seu art. 3º prevê que: “As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade”, com destaque para seu parágrafo único: “A responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas, autoras, coautoras ou partícipes do mesmo fato”.

Com isso em mente, é evidente a exposição da pessoa jurídica, que explore atividades relacionadas ao meio ambiente, desprovida de um programa efetivo e estruturado de compliance ambiental, vez que a cadeia de responsáveis pelos atos ilícitos ambientais abrange a quase integralidade de atores em uma organização, inclusive abarcando fornecedores, parceiros e investidores.

O mesmo vale para a responsabilidade civil, pois a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é assente no entendimento de que, “para o fim de apuração do nexo de causalidade no dano ambiental, equiparam-se quem faz, quem não faz quando deveria fazer, quem deixa fazer, quem não se importa que façam, quem financia para que façam, e quem se beneficia quando outros fazem”[1], ou seja, vasto campo de funções para aplicação e exigência de um programa de conformidade ambiental.

Dados esses contornos, emerge novo estágio gerador de reflexões em favor da aplicação do compliance em ramos específicos da conformidade, como a exemplo da regulação ambiental, cuja complexidade ainda aloca o compliance a desempenhar relevante reforço das políticas públicas de tutela ambiental (SARAIVA, 2018, p. 163).

Em suma, um efetivo programa de compliance ambiental vem a contribuir, não apenas para a gestão dos riscos ambientais das pessoas jurídicas, como também – e principalmente – na concretização da prevenção e do controle contínuo dos impactos ao meio ambiente, a fim de uma consecução material de desenvolvimento sustentável.

REFERÊNCIAS

ARAGÃO, Alexandra. Compliance ambiental: oportunidades e desafios para garantir um desempenho empresarial mais verde, real e não simbólico.In: ARAGÃO, Alexandra et al. Compliance e Sustentabilidade: perspectivas brasileira e portuguesa. Coord. ARAGÃO, Alexandra; GARBACCIO, Grace Ladeira. Coimbra: Instituto Jurídico da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 2020.

SARAIVA, Renato Machado. Criminal compliance como instrumento de tutela ambiental: a propósito da responsabilidade penal de empresas. 1.ed. São Paulo: LiberArs, 2018.


[1] STJ, REsp n. 650.728/SC, rel. Min. Herman Benjamin, j. 23/10/2007, Data de publicação: DJe 02/12/2009.

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Liliana Santo

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