Lara Fábia Rodrigues Evangelista
Graduanda do Curso de Direito
Aluna-pesquisadora do GPCom

O presente ensaio objetiva a análise dos crimes de colarinho branco e seus desdobramentos durante a pandemia da covid-19, considerando a relevância dos programas de compliance na administração pública, assim como expor o contraste da ausência destes programas na condução da pandemia. A discussão acerca do tema dos crimes de colarinho branco durante a pandemia, tem por interesse identificar os elementos habilitados de reprimir, coibir condutas antiéticas e corruptas, bem como incorporar princípios que norteiam os indivíduos a práticas honestas, para que o escopo social não carregue as consequências de atividades ilícitas do poder público. 

Edwin H. Sutherland (1939), leciona que as teorias convencionais da criminologia estão, em sua maioria, equivocadas, visto que parte dessas pesquisas arrematam apenas as classes mais baixas da sociedade, tornando assim, a criminalidade inerente a pobreza, fato que o autor discorda. Sutherland batizou aqueles que estão alocados em posições sociais elevadas e desviam suas finalidades profissionais para cooptarem vantagens indevidas de criminosos de colarinho branco. O autor também afirma, que os crimes de colarinho branco são segregados dos crimes comuns devido as circunstâncias que remontam estas infrações, pois dificilmente são reconhecidos como criminosos. O autor exemplifica que o delito supracitado pode suceder nos âmbitos privado e público e, pontua a dificuldade que os servidores público e privado têm em relação à integridade. 

Igualmente, destaca-se a criminalidade especificamente na política, pois é palco para grandes esquemas de corrupção, como tem ocorrido no Brasil. Assim sendo, quando a corrupção adentra a Administração Pública causa grande debilidade social, visto que a verba direcionada para políticas públicas, é desviada para fomentar as organizações criminosas. Por conseguinte, o Código Penal passou por diversas novas redações como a Lei n.º 10.467/02; a Lei n.º 9.613/98 que dispõe acerca dos crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores; a Lei n.º 12.683/12 tornando mais rigorosos os crimes de lavagem de dinheiro; e a Lei n.º 12.846/13 e o Decreto n.º 8.420/15, conhecido como a Lei Anticorrupção e seu decreto regulamentador. Desta maneira, apresentar uma frente sólida contra os crimes torna-se um trabalho árduo quando os criminosos de colarinho branco, movimentam a máquina pública, havendo corruptos em todos os poderes. Neste sentido, a corrupção, em especial no setor público, demanda severa fiscalização, dado a grave lesão à sociedade que crimes provenientes da corrupção sucedem, em consequência, do desvio ou lavagem, as esferas públicas prosseguem sem o devido comprometimento.  

De fato, o obstante não é inexistência de legislação, mas a aplicabilidade das normas. Assim, a figura do compliance adentra o âmbito público refletindo como um pino de segurança que busca a previsibilidade dos riscos e criando estratégias para nortear os funcionários públicos a práticas que preservem o patrimônio público, por meio da honestidade e ética no exercício de suas funções. Igualmente, há exemplo pertinente que ilustra como a corrupção pode afetar o enfrentamento a pandemia. 

No dia 14 de outubro de 2020, a Polícia Federal deflagrou uma operação em combate ao um suposto esquema de desvio de verbas públicas destinadas ao combate à pandemia em Roraima. Nesta operação, o Senador Chico Rodrigues foi alvo de busca e apreensão em sua residência, o que não era esperado do senador seria a tentativa de esconder dinheiro nas vestes durante a busca e apreensão. Por conseguinte, no parecer do Ministério Público Federal, há elementos de provas colhidos na investigação que apontam para a participação do Senador no esquema de desvio de verbas públicas destinadas ao combate à pandemia da Covid-19. Assim, ‘’No Brasil, a falta de integridade de governantes literalmente tirou o oxigênio das pessoas’’ (TIB,2020). O primeiro ponto que representou o retrocesso ao combate a corrupção seria o ‘’desmantelamento das forças-tarefas como Lava Jato e Greenfield, sem a substituição por um modelo alternativo adequado’’. Segundo ponto, o sistema de saúde brasileiro já possui um histórico de ingerência na qual sucedeu o colapso do SUS – Sistema Único de Saúde – durante a pandemia. Logo, medidas de transparência não foram aplicadas pelos governantes e os cidadãos brasileiros estavam vivendo numa completa escuridão informativa por parte do Governo Federal. A exemplo do aditamento da Medida Provisória n.º 928, de 2020, que seus dispositivos mitigavam o funcionamento da Lei de Acesso à Informação, logo suprimida pelo STF (Superior Tribunal Federal). 

Diante de todo cenário apontado, os programas de compliance demonstram-se pertinentes para uma reviravolta na condução pandemia. Pois, a sua efetividade não advém, somente, em agir de acordo aos comandos, todavia, mira em estruturar estratégias funcionais e identificar iminentes e possíveis riscos e incorporar valores éticos. Aliás, o programa de compliance apresentando uma estrutura de prevenção, tornou-se fonte de segurança jurídica e um ambiente confiável para decisões públicas complexas, principalmente, na pandemia. Assim, compreende-se que os programas de compliance não são limitados por respectivos códigos de condutas, e estes, não são capazes de incorporar os padrões íntegros que o programa tanto almeja.

O presente estudo tem por finalidade analisar a maneira com qual a Administração Pública conduziu as primeiras ondas da pandemia e como os crimes de colarinho branco contribuem, relevantemente, para o colapso da saúde pública em 2020. Paralelamente, serão propostos os seguintes objetivos: i) refletir a relevância do compliance na Administração Pública, sendo crucial para evitar os desvios de capital público, identificando e punindo os corruptos; ii) identificar os setores do âmbito público que afetam, diretamente, o sucesso ao combate da pandemia; e iii) propor efetividade na disponibilização das informações públicas, gerando transparência e segurança jurídica para a sociedade. 

Em razão dos apontamentos iniciais procedeu-se a análise de casos práticos direcionados ao Poder Judiciário, nos casos em que se expõe desvios de verba pública para o combate da pandemia, há a necessidade de esclarecer tanto a conduta do agente corrupto, como se a sanção foi proporcional do prejuízo causado aos direitos coletivos. A partir disso afirmar se, de fato, os criminosos de colarinho branco estão sendo devidamente responsabilizados.

Este ensaio fundamenta-se em uma pesquisa bibliográfica e documental de acordo com a proposta inicial, escolheu-se neste projeto pela análise de caráter qualitativo e quantitativo, assim, faz-se imperioso empregar a utilização de metadados e ferramentas de pesquisa contidas na rede mundial de computadores. O projeto embasa-se verificação bibliográfica proposta com a finalidade de buscar conceitos e posições que fundamentassem o texto relevantemente no que tange a classificação dos crimes de colarinho branco e compliance. Posteriormente, para averiguação de desvios de verbas públicas por figuras públicas/políticas, fez-se imprescindível a pesquisa documental de caráter quantitativo.

Em virtude dos argumentos apresentados, conclui-se que a corrupção permanece sendo endêmica e, no presente contexto, as sucumbências sociais são inestimáveis. Assim, a conduta abusiva e reiterada cometida pelos criminosos de colarinho branco propiciaram a crise sanitária que os brasileiros vivem, atualmente. Logo, fazendo-se imperiosa, mais do que aplicação, porém, a efetividade dos programas de compliance na Administração Pública. No que concerne, até então, dos casos práticos são a ingerência e desonestidade por parte dos governantes e completa indiferença com o colapso sanitário brasileiro. Igualmente, a mitigação ao acesso as informações o que finda numa completa insegurança social. Assim, o compliance efetivo refere-se à uma possível solução para a pandemia e a crise de corrupção vigente no Brasil. 

REFERÊNCIAS 

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Categorias: Artigos

Liliana Santo

Fundadora e Presidente da EduCompliance.